terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

Eu sou o Lalau, amigo da Lili e também já tive um cão chamado Lobo, que nada tinha de mau!

Meu nome de batismo é Geraldo Magela, que recebi ainda antes de haver nascido, para fazer cumprir a promessa de minha boa bisavó Dadá (Idalina Sena) que, além do nome tomado emprestado do Santo, comprometeu-se ela, também, de que minha primeira comunhão e também dali a algum tempo, a minha futura ordenação como padre, além dos demais sacramentos de minha obrigação cristã, todos haveriam de ser testemunhados pelo milagroso servo de Jesus, lá na sua linda e famosa basílica da cidade de Curvelo, que é o "coração de Minas". O meu batismo, por força deste voto, também era compromisso incluido na promessa mas assim não logrou de ser realizado porque naquele tempo os meios de transportes eram raros e caros, enquanto que as crianças de então não podiam ficar pagãs por muitos meses, ainda mais se a dita fosse raquítica e nascida de um casal de poucos recursos financeiros, como era o meu caso em particular, com a agravante da imensa dificuldade que se apresentava, como o fato de morarmos tão longe do local combinado para acontecer tanta cerimômia, distante mais de 300 km. do lugar onde nasci, a velha e maltratada cidade de Minas Novas.

Dessa situação episódica decorreu o fato de ter sido batizado, às pressas, na mesma pia da Igreja de São Francisco em que, há decadas, também fora ungido o menino Serafim, hoje o nosso Cardeal Serafim Fernandes de Araujo.

Não foi lá aquela cerimônia pomposa como desejava minha bisavó, em virtude de uma implicância que o meu bisavô Domingos Mota tinha, e não procurava dissimular, em relação do Padre Sacramento, vigário daquela época, que por minha sorte momentânea, foi substituido pelo Padre Jaime, novato na cidade.

Mas a bem da verdade, todo e qualquer sacrifício se justificaria diante de tantos milagres que atribuo ao meu bom santinho, com a mais absoluta convicção de que todos os favores celestiais foram obtidos com a intermediação dele.

E não bastasse haver-me livrado de tantas mazelas como o sapinho, a diarreia, o sarampo, a catapora e a caxumba, das quais escapei com vida e saude, várias foram as vezes que aliviou-me o lombo para receber as boas varadas de cipó de marmeleiro e os homéricos beliscões aplicados pelas mestras, estas terríveis monstras que tinham a incrível coragem de punir-me, logo a mim que era tido como um verdadeiro santo -- para minha vovó tão puro e tão mimoso como o padrinho - apesar de bem saber que o afilhado não era assim tão bom aluno como afirmava ser, pois ele próprio fazia questão de repetir o ano só por implicância com as professoras que o perseguiam e dele exigiam sua frequência naquele vetusto Grupo Escolar que até o nome dava medo: Coronel Zé Bento (cruz-credo!), pois antes fosse Zé, o Capeta Que o Carregue... Contudo, foi nesta longeva escola, que era a única existente num raio de 100 km que, a trancos e barrancos, eu consegui tirar o meu primeiro diploma, por obra e graça de Dona Elizinha, Tia Celina e Dona Augusta que, além de ótimas educadoras, a primeira era prima de minha mãe e casada com o irmão de meu pai; a segunda é minha tia de verdade, pois é irmã de meu pai, além de ser minha madrinha; e a terceira ser uma prima distante, tanto pelo lado de meu pai como pelo lado de minha mãe. sendo que, por esta justa razão, sempre estaria tudo resolvido, principalmente pelo fato de que eu não concordava nunca e jamais de estudar aritmética, soletrar lições, decorar verbos, além de não acreditar nos heróis e fatos da história do Brasil, declinando-se dessas aulas e só concordando ficar na biblioteca escarafunchando, por conta própria, os livros e arquivos que ali se empoeiravam. E foi justamente por causa de um desses livros, que eu muito gostava, que me apelidaram com o nome de um dos personagens (Lalau, Lili e Lobo)e a partir daí apaixonei-me, não só pela Lili mas também pelas aventuras e peripécias que naquelas poucas páginas se narravam.

Antes de terminar o quarto ano do curso primário, um belo dia fomos colocados num jipe, tendo o primo Rodolfinho ao volante, eu e minha vovó assentados a seu lado, e no banquinho de madeira, da parte de trás, os meus pais, minha irmã Anália (Santinha) e nossa querida amiga Ritinha de Cecília, todos muito compenetrados e piedosos, que seguíamos para a longínqua Curvelo, onde chegamos depois de 03 dias de sofrida viagem, num dia em que terminava o famoso jubileu dos Padres Redentoristas. Era esse o dia da Festa de São Geraldo do ano de 1959.

Logo depois da minha cerimoniosa primeira comunhão, no meio daquele mundaréu de romeiros, minha Vovó Idalina toda garbosa em seu vestido azul escuro, coberta com um chale de lã preta e uma manta negra de filó caindo-lhe da cabeça, levou-me ela pela mão até um dos padres ali de plantão e a ele, apontando-me o dedo, apresentou-me como o futuro bispo, já eliminando, de pronto, com a etapa da ordenação como padre, quase que já antevendo a minha canonização.

Aquela foi a nossa primeira viagem (minha e de minha vovó), que além de ter o ineditismo de ser motorizada, foi a única que, para ela, excedeu aos 20 km que havia entre a sua casa e a de sua neta, minha tia "Menininha" que morava na vizinha vila de Piedade, hoje a progressista cidade de Turmalina. Pouco tempo depois, para minha tristeza, resolveu a boa velhinha, na sabedoria de seus quase 90 anos, partir para uma viagem ainda mais longa, onde está até hoje, ao lado de seus companheiros celestes, esperando o cumprimento do restante de sua promessa. O pior é que a Igreja Católica, aqui no Brasil ainda não permite que homens casados se tornem padres, enquanto que as outras igrejas, que não permitem santos, até que aceitariam-me lá até na condição de Bispo, mas tal presunção não me parece justa, pois estaria a imitar aquela atitude de minha vovó, naquela apresentação do sacerdote de Curvelo, no dia em que recebi a primeira hóstia.

E assim tem sido a minha vida, como aquela romaria que fizemos, sendo bem parecidos os caminhos imprevisíveis das viagens que devemos enfrentar, mesmo as de muita aventura, que devem transcorrer segundo a vontade de quem, na verdade, é o Dono de Todos os Destinos. O meu, até aqui, tem sido acreditar na misericórdia de Deus, seguir em frente e amar com toda a força de meu coração a memória de minha bondosa Vóvó, com a qual aprendi, muito mais do que nas lições de minhas tias-mestras, que o que se deve buscar é a sabedoria da simplicidade, a grandeza da fé e a felicidade que existe em cada coisa, em cada passo, até mesmo no compasso miúdo, quase arrastado, como aquele de sejeitinho de caminhar dificultoso, como quem pisando em ovos, com os quais a minha vovozinha, mesmo assim, conseguir chegar onde queria ir e que não a impedia de visitar-me todos os dias, levando-me de presente um figo maduro, um pé-de-moleque, uma manga sapatinha ou então um pedaço de requeijão molhado no mel.

As lembranças que tenho dessa é época é doce como o néctar das abelhas, mas a minha vida, que não é tão doce mas da qual não posso dizer que tem sido muito amarga, vai seguindo com as bençãos do meu padrinho São Geraldo Majela; e faço o possível para que o meu percurso seja agradável, seguindo temperando o doce ora com o ciclamato, ora com a sacarina, quando a gligose é muita, a insulina pouca e enquanto o médico não recomenda cortar a rapadura, que bem sabemos é doce mas não é mole.

Da minha saudosa VOVÓ DADÁ muitas histórias eu vou contar neste meu BLOG. E será através de minha memória que eu desejo homenagear essas queridas personagens de minha vida, que ainda fazem parte das minhas doces fantasias. E serão muitas as pessoas de quem me lembro cujas histórias mecerem ser contadas, de forma que, fazendo essa viagem de retorno, nesta preciosa máquina do tempo, vamos também resgatando a memória não escrita de nosso velho município de Minas Novas.

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