sábado, 2 de abril de 2011

POETAS MINEIROS

MINAS GERAIS, terra do ouro, do diamante, dos inconfidentes, dos políticos sérios, das montanhas, do pão-de-queijo, da pinga de Salinas, da marmelada de Minas Novas e dos banqueiros, também é terra dos grandes  escritores e dos melhores  poetas brasileiros.

Com referência a estes últimos, a maior parte é ainda desconhecida em razão do fato de que poesia não é mercadoria de muito boa aceitação e também em razão de que nós, mineiros, em questão de marketing, sempre perdemos para o eixo Rio-São Paulo, além de que, sempre preocupados com bancos, com governos e com igrejas, nas Alterosas se esqueceram nossos empresários de investirem na indústria gráfica, mormente no segmento literário.

Contudo não há, em outras plagas, poetas como os nossos, a começar  pelo insuperável e saudoso ADÃO VENTURA, sem se falar em Adélia Prado, Abílio Barreto, Thomaz A. Gonzaga, Glac C. Coura e muitos outros de quem, logo adiante, vamos tecendo algum comentário.


CONGADO

 (Adão Ventura)

Reis e rainhas
príncipes e princesas
não deixem
que minha força se vá
pela correnteza
de mil dúvidas
e nós travados
pela
vida
cada
vez
mais
cáustica.


**********************************


GLAC CESAR COURA, tem no registro de nascimento a cidade de Diamantina, onde apenas nasceu, pois imediatamente foi levada para Minas Novas, terra de seu pai e de seus avós. Faz parte da brilhante safra inaugural do famoso GINÁSIO MINAS NOVAS fundado e administrado pelo inolvidável médico Dr. Agostinho da Silva Silveira, em cujo educandário também se formaram ilustres cidadãos como Antônio José de Andrade e Maria Alice de Andrade (irmãos) - Arlindo e Achiles de Castro Maciel (irmãos) - João Eugênio Coelho - Homero Santiago Maciel - Roosevelt de Oliveira - Maria das Graças Mota Figueiró, Raimundo Nonato e Maria da Conceição Mota Figueiró (irmãs) - Joaquim Manoel Luiz,  Luzia e Manoel Alecrim do Espírito Santo (irmãos) - Márlio Geraldo Costa e Laura Aracy Costa (irmãos) - Raimundo Chagas Coelho - Elias Sena Mota - Magadalia Vieira Camargos - Geraldo Eustáquio Fernandes - Pedrelina Marques Fernandes - Francisco Lopes Vaz - Geraldo Luiz Chagas - Marcílio Sena Mendes e Marilia Eunice Sena Mendes (irmãos) - Inocêncio, Marina e Benvinda Nepomuceno Leite (irmãos) - Vanda América, Edgar Francisco e Humberto Eustáquio  de Souza (irmãos) - Maria Leni, Maria Geralda, Maria de Fátima, José Alberto e Fernando Fernandes (irmãos), Altamiro Natalino Sena e Alvacira Noemi Sena (irmãos) - Eustáquio, Fátima, Dimas, Adão Carlos e Carlos Adão Evangelista (irmãos) -Rita Ferreira da Silva e José Maria do Sacramento (irmãos) -  Djalma Wagner Viana - Dailson Cristóvão, Eustáquio Fausto, Hely Raimundo e Vera Lúcia Fernandes (irmãos) - Pedro Heli e Maria José Camargos Sena (irmãos) - Cecília Pereira Amaral - Ubiracy Ferreira - Ana Mota Ramalho - Carlos Domingos Mota, Anália da Graça e  Elisa Maria Mota Coelho (irmãos), Aranilde, Aralucia e Aradália Leão (irmãs),  Regina e Berenice Nepomuceno Sena (irmãs), Marisa Eliana Teles, Sidney Magela Silva, Maria Herculana Mendes Santos, Rosa Ferreira Gomes Carneiro, Rosária Antoniana Sena, Maria do Rosário e Maria do Carmo Vieira (irmãs) e tantos outros invejáveis alunos.






QUANDO DORMI, VEIO UM ANJO

...e me roçou levemente.

Veio de manso e de longe
na noite desprotegida.

Debruçou sobre meu
sono leve e marcado de
rebuliços e
inquietos jogos,
de palavras longas e
desnecessárias.

Enquanto dormia um anjo
deixou sua mão esquecida
sobre o meu corpo
resignado.

Descortinou o infinito 
e misturou-se nele
e aos meus pensamentos
irreveláveis.

Dormia
quando um anjo
rompeu meu mundo de sonhos
e induziu meu
despertar.

Quando acordei
vi um anjo.

Glac Coura  nasceu em Diamantina (MG); viveu sua infância na cidade de Minas Novas, no Vale de Jequitinhonha, onde seu pai ATALIBA CÉSAR se notabilizou como um dos melhores advogados já produzidos neste Estado de Minas Gerais. Ela, também formada em Direito (UFMG) e Administração de Empresas, atualmente é Gerente de Projetos da Fundação Dom Cabral. Publicou seu 1º livro de Poesias “Fragmentos” em 1992. Participou com diversos poemas da Antologia Poética Zumbi dos Palmares (1995) da Revista Literária “Petrínia”, Ciempozuelo – Madrid, coletânea de poemas de escritores de Língua Portuguesa. Obteve o 2º lugar no Concurso Nacional Zumbi de Poesia e Prosa, pelo CEPA – Salvador (BA) – 1995. No ano seguinte, classificou-se em 4º lugar no Concurso Nacional de Poesia da Academia de Letras – APLA do Paraná e recebeu o Prêmio “Destaque” no XVII Concurso Nacional de Poesias , promovido pela Revista Brasília (DF). A autora foi citada no “Dicionário Crítico de Escritoras Brasileiras”, obra organizada pela escritora e professora de literatura da USP Nelly Novaes Coelho, lançado em 2202, pela Escrituras Editora (SP). Em 2004 publicou o 2º livro de Poesias “Mosaico”. 
* * * * * * * 

Ricardo Aleixo é poeta, músico, artista visual e ensaísta. Publicou, entre outros, os livros Trívio (2001) e Máquina Zero (2004). Tem, no prelo, o livro de ensaios Palavras a olhos vendo – Escritos sobre escritas. É curador do FAN-Festival de Arte Negra e da ZIP-Zona de Invenção Poesia &. Integra e performer do Combo de Artes Afins Bananeira-ciência e a Cia. SeráQuê?.

PAUPÉRIA REVISITADA

Putas, como os deuses,
vendem quando dão.
Poetas, não.
Policiais e pistoleiros
vendem segurança
(isto é, vingança ou proteção).
Poetas se gabam do limbo, do veto
do censor, do exílio, da vaia
e do dinheiro não).
Poesia é pão (para
o espírito, se diz), mas atenção:
o padeiro da esquina balofa
vive do que faz; o mais
fino poeta, não.
Poetas dão de graça
o ar de sua graça
(e ainda troçam
 na companhia das traças 
de tal “nobre condição”).
Pastores e padres vendem
lotes no céu
à prestação.
Políticos compram &
(se) vendem
na primeira ocasião.
Poetas (posto que vivem
de brisa) fazem do No, thanks
seu refrão.

Fernando Fábio Fiorese Furtado

Nascido no dia 21 de março de 1963 na cidade de Pirapetinga (Zona da Mata, Minas Gerais, Brasil), Fernando Fábio Fiorese Furtado transferiu-se em 1972 para Juiz de Fora, na mesma Zona da Mata.[1] Nesta cidade, concluiu o ensino fundamental (Grupos Centrais e Colégio de Aplicação João XXIII), o curso técnico de Edificações (CTU/UFJF, 1981) e a graduação em Comunicação Social/Jornalismo (1986).
Juntamente com José Santos, Suraia Mockdeci, Mauro Fonseca, José Henrique da Cruz, o "Mutum", Vanderlei Tomaz e Walter Sebastião, dentre outros, criou e editou o folheto de poesia Abre Alas e a revista d’lira, publicados em Juiz de Fora nas décadas de 1980 e 1990.
Possui mais de dez livros editados, entre poesia, prosa de ficção e ensaio, bem como numerosos textos veiculados em publicações brasileiras e estrangeiras (ver abaixo).
Atua como professor da Faculdade de Letras e do Programa de Pós-Graduação em Letras: Estudos Literários da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), desenvolvendo pesquisas nas áreas de Poesia Contemporânea e Literatura e Imagem.
A partir de 2010, decidiu assinar suas obras apenas como Fernando Fiorese.

Mulher Dormindo

apenas a alma dorme
o corpo insone
trabalha
os minérios do sono
sustenta o pânico
o naufrágio
na penumbra
fogo e relva
os músculos dançam
debruçados sobre o nada

os olhos não
os olhos sonham
à sombra da alma
- e sobrevivem
ao dilúvio

* * * * * * * * * *

ADÃO VENTURA


ADÃO VENTURA Ferreira Reis nasceu  em Santo Antonio do Itambé, MG, em 1946.   Formou-se em  direito pela UFMG   e em    1973 a convite da University of New Mexico,  foi para os Estados Unidos onde lecionou  literatura contemporânea.
Publicou diversos livros, dentre eles A cor  da  PeleTexturafro As musculaturas do  Arco do Triunfo,  já  participou de várias    antologias e seus poemas foram traduzidos  para o inglês e o alemão.  Teve um de seus poemas incluído na antologia Os Cem Melhores Poemas Brasileros do Século, organizada por Italo Moriconi ( Editora Objetiva - SP). Sua poesia mostra-se impregnada pelas  questões da negritude e, simultaneamente,    por uma simplicidade que a faz legítima,  e  fluida, ou como escreveu  Manoel Lobato: "A iniquidade do mundo e o mistério da    vida gritam na sonoridade de seus versos".

Em 2002 publicou Litanias de Cão.Faleceu em junho de 2004.

Sobre Adão Ventura, escreveu Manuel Lobato: “A iniqüidade do mundo e o mistério da vida gritam na sonoridade de seus versos”.
            
Eis alguns exemplos de sua poesia militante:

Para um negro

para um negro
a cor da pele
é uma sombra
muitas vezes mais forte
que um soco.
para um negro
a cor da pele
é uma faca
que atinge
muito mais em cheio
o coração”.

e

“Das biografias – 
Um

em negro
teceram-me a pele
enormes correntes
amarraram-me ao tronco
de uma Nova África.

carrego comigo
a sombra de longos muros
tentando impedir
que meus pés
cheguem ao final
dos caminhos.

mas o meu sangue
está cada vez mais forte.
tão forte quanto as imensas pedras
que meus avós carregaram
para edificar os palácios dos reis”.


               
Formado em direito pela Universidade Federal de Minas Gerais, UFMG, em 1973, Adão, a convite da University of New México, foi para os Estados Unidos, onde lecionou literatura contemporânea.


Embora pouco lido e pouco divulgado – por ser negro? -, Adão publicou diversos livros, dentre eles A cor da pele, Texturafro e As musculaturas do Arco do Triunfo. São livros difíceis de serem encontrados. As editoras, pouco preocupadas com a poesia negra, não os reedita. E ninguém os encontra em sebos.


Adão Ventura participou de várias antologias e seus poemas foram traduzidos para o inglês e o alemão. Um de seus poemas, inclusive, foi incluído na antologia Os Cem Melhores Poetas Brasileiros do Século, organizada por Ítalo Moriconi para a Editora Objetiva, de São Paulo.


Em 2002, o poeta negro, publicaria mais um livro difícil de ser encontrado: Litanias de C Cão.


Ainda desconhecido por parte de muitos professores de literatura, alunos de Letras, escritores e jornalistas, Adão faleceu em junho de 2004.


Como um poeta tão grande e tão nobre pode ficar de fora dos cursos de Letras, de livros de literatura e da “rodinha” literária?


O jornal Estado de Minas, felizmente, comentou seu falecimento, em 2004, fazendo uma retrospectiva de sua vida e de sua obra, tão justamente lembrada.

* * * * * * * * * * 

Adélia Prado

Com licença poética
Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo.  Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.


Adélia Luzia Prado Freitas (Divinópolis, 13 de dezembro de 1935) é uma escritora brasileira. Os textos retratam o cotidiano com perplexidade e encanto, norteados pela fé cristã e permeados pelo aspecto lúdico, uma das características o estilo único.

Segundo Carlos Drummond de Andrade, "Adélia é lírica, bíblica, existencial, faz poesia como faz bom tempo: esta é a lei, não dos homens, mas de Deus. Adélia é fogo, fogo de Deus em Divinópolis". A escritora também é referência constante na obra de Rubem Alves.

Professora por formação, exerceu o magistério durante 24 anos, até que a carreira de escritora tornou-se a atividade central.

Em termos de literatura brasileira, o surgimento da escritora representou a revalorização do feminino nas letras e da mulher como ser pensante, tendo-se em conta que Adélia incorpora os papéis de intelectual e de mãe, esposa e dona-de-casa; por isso sendo considerada como a que encontrou um equilíbrio entre o feminino e o feminismo, movimento cujos conflitos não aparecem nos textos.




JOSÉ ELOI OTTONI


JOSÉ ELOI OTTONI
 (1764-1851)


José ELOY OTTONI - Natural, da Villa do Principe, depois cidade do Serro, Minas, nascido a 1º de dezembro de 1764 e falecido na cidade do Rio de Janeiro a 3 de outubro de 1851.

Viveu sua vida adulta na Vila do Bom Sucesso do FANADO (hoje a cidade de MINAS NOVAS), onde era Professor de latim, passando depois a oficial da Secretaria da Marinha na cidade do Rio de Janeiro, onde faleceu. 


Deixou poesias avulsas, que figuram em várias seletas e coleções de poetas nacionais e portugueses.


MARÍLIA

Sonhei, Marília, que contigo estava,
Que o tenro Honório alegre me dizia :
Meu pai ! apenas este nome ouvia,
Suspenso nos meus braços o apertava.

Que a pequena Eduviges reparava
No meu semblante; como que sorria :
Que os braços amorosa me estendia
E que eu chorando as faces lhe beijava.

Antes, Marília, o sonho eu não tivera !
Nos braços da saudade despertara
Porém dor tão pungente não sofrera :

Sonhei, Marília, o que antes não sonhara,
Pois passando de um gozo ao que não era,
Sem filhos, sem Marília. não me achara.


Soneto

Portugueses! A nuvem tenebrosa
Qu’ofuscava a razão desaparece,
Desfez-se o caos que a discórdia tece:
Já se encara sem medo a luz formosa.

Dos erros a progênie maculosa
Baqueando em soluços estremece.
A justiça dos céus ao trono desce,
Marcando os faustos à nação briosa.

Lísia, berço de heróis, oh Lísia, alerta!
Cumpre que os ferros o Brasil arroje,
Seguindo o impulso que a razão desperta.

A expressão de terror desmaia e foge,
Graças à invicta mão que nos liberta,
Escravos ontem, sois Romanos hoje!


[Ó lágrimas, ó pérolas!] 


Ó lágrimas, ó pérolas1 A aurora
É menos pura do que vós sois belas,
Do sol do amor, ó úmidas estrelas,
Aljôfar da manhã, riso de Flora.

Ó faces de que Febo se namora
Quando meiga ternura acode a vê-las,
Se há graças devem ser somente aquelas
De uma alma ingênua que suspira e chora.

Nos olhos de Marília o pranto agrada,
Maviosa expressão de olhos serenos,
Dá glória aos numes, existência ao nada.

Ó lágrimas, ó pérolas, ao menos
Vós sois na mais serena madrugada
Intérpretes de amor, alma de Vênus!

O Livro de Jó (trechos)

Capítulo II

Contra Deus, contra Jô, de novo atenta
O inimigo da Luz, pseudo-profeta,
Que entre os coros dos Anjos se apresenta.
Pergunta-lhe o Senhor: - Não foi completa
A vitória de Jó? Consideraste
Como é firme a inocência, porque é reta?
-Em vão eu o afligi - : tu me incitaste.
As palavras de Deus Satã repele,
Dizendo: -Tu, Senhor, o excetuaste,
A mão eu pus em tudo, exceto nele;
Bem vês, que os homens por salvar a vida
Darão tudo o que têm, pele por pele.
Estende agora a mão, deixa que erguida
Toque-lhe a carne, aos ossos não perdoes,
Tu verás a inocência então perdida;
Inda espero, que Jó te amaldiçoe
Face a face. - Pois sofra, e não pereça;
Que o teu braço se estenda, e que magoe,
Eu to permito, vai. - Satã se apressa,
E a Jó ferindo, o deixa aberto em chaga
Desd’os pés até o alto da cabeça.
Jó no esterco raspando a imunda praga,
Depois que em podridão maligna escorre,
C’um pedaço de telha o corpo afaga.
Sua mulher, que o vê, mas não discorre,
-Perseveras, lhe diz, sem que te rales,
Louvando a mão de Deus? Pois louva, e morre.
Diz-lhe Jó: - Cumpre, ó louca, que te cales;
Se os bens da mão de Deus tu recebeste,
Porque não deve receber os males?

(...)
Capítulo VI

Oxalá, - disse Jó - que os meus pecados,
Objetos d’ira, e tudo que eu padeço,
Fossem como em balança bem pesados!
Ver-se-ia então pender com mais excesso,
Que as areias do mar, tormentos, dores,
Verdugo d’alma, da razão tropeço;
Tem os males na voz os condutores.
O Senhor ergue o braço, e me asseteia,
Combatem contra mim do Céu terrores.
Devoro a indignação, devoro a idéia
De meus males. No monte orneja o bruto,
Muge o boi, quando o pasto lhe escasseia.
Faltando o sal, é insípido o conduto;
Quem bebe, ou come, o que desgosta, e mata?
Eu fugia ao trovão, que agora escuto.
A amargura, se outrora me era ingrata,
Hoje a aflição é todo o meu sustento:
Que ansioso desejo me arrebata!
Quem me dera, Senhor, que o meu tormento,
Já que origem lhe deste, se acabasse,
Reduzindo-me ao pó, que espalha o vento!
Ou quem a meus rogos de furor se armasse
A mão qu’imploro, a mão, de quem o espero,
Como pela raiz me decepasse!
Aflige-me, Senhor, sê mais severo,
Que eu sem opor-me ao Santo por essência,
Que me acabes de dor, aspiro e quero;
Eis meus votos, Senhor. Que resistência,
Posso eu ter se não tenho fortaleza!

(...)
Capítulo XXXVII

Inquieto o coração no peito bate!...
De seu poder a idéia me horroriza!
Escuta o som terrível do combate!...
Eis a voz do trovão, que se desliza,
Sai da boca de Deus. Grandes da terra,
Ouvi, tremei... Se o eco atemoriza,
Que horror não vem do raio, que ele encerra!
Tubo abaixo do Céu, ele examina,
Do relâmpago a luza desfaz, desterra
As sombras do Universo. Ele domina
Sobre a voz da grandeza; trovejando
Após Ele o terror, e o eco ensina
O ruído da voz. De quando em quando
Ele soa e ninguém a compreende.
O ribombo das serras atroando,
Maravilhas de Deus o eco aprende,
Que Ele é grande, insondável, reconhece.
Manda a neve que tombe, ela se estende
Sobre os campos; a chuva lhe obedece;
Desprende aluviões, põe selo a tudo;
E o malvado a si mesmo se envilece;
Tudo à voz da tormenta é quedo, e mudo.
Sopra o vento do Arcturo enregelado;
Busca ao frio o calor, ao medo escudo
A fera no covil. É gelo o prado,
A um assopro de Deus a fonte é gelo;
Que de frio em torrentes derramado
Se derrete e desfaz. Na espiga o grelo
Da seara co’as nuvens alegrando
Reparte ao camponês co’a luz desvelo.
As nuvens tudo em torno alumiando
A vontade lh’espreitam e obedecem.
Um leve aceno seu aproveitando,
Sobre a terra, que é sua, as nuvens descem.
Seja tribo estrangeira, em qualquer parte
De seu gosto e vontade, se esclarecem.
Ouve, Jó, maravilhas, que reparte
A mão do Onipotente, considera
Contigo mesmo... E pode tu dest’arte
Sabe o que em si mesmo Ele pondera,
Quando à chuva mandou que descobrisse
De seus raios a luz que aparecera?
Porventura houve mão que dirigisse
Das nuvens a vereda? Ou regulando
A sua inteligência ao menos visse
O grau da perfeição? Calor mais brando
Ou mais forte o vestido não te aquece,
Do meio-dia os ventos assoprando?

Provérbios de Salomão (trechos)
12.

Eu sou a sabedoria
Que delibero em conselho;
Assisto aos judiciosos,
Tanto ao moço como ao velho.
15
É por mim que os reis imperam
Nos corações por amor;
As minhas leis é que formam
O sábio legislador.
18
Os tesouros da abundância
Pelo meu braço se entornam,
Riquezas, glória, justiça,
Magnificência me adornam.
21
Nos caminhos da eqüidade,
Nas veredas da prudência.
Com quem me ama eu reparto
Além do amor, opulência.
22
Na mente eterna incriada
O Senhor me possuía;
Antes de haver criatura
Eu já coeterna existia.
26
No globo o caos ainda
Não mostrava o que ele encerra,
Nem dos rios a corrente,
Nem os dois pólos da terra.
27
Quando ao autor do firmamento
Aos abismos prescrevia
Certas leis, a tudo estava
Presente a sabedoria.


Desenho de Calisto

  Alphonsus de Guimaraens


Nasceu em Ouro Preto-MG, em 24.7.1870 e faleceu em Mariana-MG, em 15.7.1921. 
Principais obras: Setenário das Dores de Nossa Senhora, Dona Mística , Kiriale, Pastoral aos Crentes do Amor e da Morte.

      A CABEÇA DE CORVO 


Na mesa, quando em meio à noite lenta
Escrevo antes que o sono me adormeça,
Tenho o negro tinteiro que a cabeça
  De um corvo representa.

A contemplá-lo mudamente fico
E numa dor atroz mais me concentro:
E entreabrindo-lhe o grande e fino bico,
Meto-lhe a pena pela goela a dentro.

E solitariamente, pouco a pouco,
Do bojo tiro a pena, rasa em tinta...
E a minha mão, que treme toda, pinta
   Versos próprios de um louco.

E o aberto olhar vidrado da funesta
Ave que representa o meu tinteiro,
Vai-me seguindo a mão, que corre lesta.
Toda a tremer pelo papel inteiro.

Dizem-me todos que atirar eu devo
Trevas em fora este agoirento corvo,
Pois dele sangra o desespero torvo
   Destes versos que escrevo.

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