ARNALDO JABOR
A
incompetência
08 de
abril de 2014 | 2h 09
Nunca vi o Brasil tão esculhambado como hoje.
Perdoem a palavra grosseira, mas não há outra para nos descrever. Já vi muito
caos no País, desde o suicídio de Getúlio até o porre do Jânio Quadros largando
o poder, vi a morte de Tancredo na hora de tomar posse, vi o País entregue ao Sarney,
amante dos militares. Vi o fracasso do Plano Cruzado, vi o escândalo do governo
Collor, como uma maquete suja de nossos erros tradicionais, já vi a inflação a
80% num só mês, vi coisas que sempre nos deram a sensação fatalista de que a
vaca iria docemente para o brejo, de que o Brasil "sempre" seria um
país do futuro.
Eu já senti aquele vento mórbido do atraso, o miasma que nos
acompanha desde a Colônia, mas nunca vi o país assim. Parece uma calamidade
pública sem bombeiros, parece um terremoto ignorado. Por que será? É óbvio que
não é apenas o maluco governo do PT, mas também as marolas que ele espalha, os
nós frouxos de uma política inédita no País que nem atam nem desatam.
Agora, tudo vai muito além da tradicional
incompetência que sempre tivemos: linear, a boa e velha incompetência pública
de sempre. Dá até saudades. A incompetência de agora é ramificada,
"risômica", em teia, destrutiva, uma constelação de erros óbvios que
eu nunca tinha visto.
No dia a dia só vemos fracassos, obras que não
terminam, maquiagem de números, roubalheiras infinitas e danosas, vemos o
adiamento de tudo por causa das eleições. Tudo vai explodir em 2015, o ano da
verdade feia de ver. O mal que essa gente faz ao País talvez demore muitos anos
pra se reverter.
Mas, aqui, não quero falar da corrupção,
burocracia, clientelismo e outras mazelas. Como é o "rationale" que
usam para justificar o desmembramento do País que estão a executar?
Quais são as principais neuroses da velha cabeça da
esquerda, suas doenças infantis, etc.?
Interessa ver o mapa do inconsciente petista.
Interessa ver a incompetência dessa gente que conheço desde a adolescência,
quando participava das infindáveis reuniões políticas para "mudar" o
País - muito cigarro e a sensação de viver uma "missão profunda". As
discussões sem-fim: "Questão de ordem, companheiro!", "o
companheiro está numa posição revisionista" ou "a companheira está
sendo sectária em não querer dar para mim".
Os fins eram magníficos, os diagnósticos tinham
pontos corretos, mas, no fim das madrugadas, alguém perguntava: "O que
fazer?" (como queria Lenin...).
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Aí, todo mundo embatucava. Ninguém sabia nada. E
tentavam agir, mas só apareciam erros desastrosos e a incapacidade de
organização concreta; mas, tudo era desculpado pela arrogância de quem se
achava na "linha justa". O povão era usado para a "boa"
consciência, o povão era o salvo-conduto para a alma pacificada, sem culpas - o
povão era nossa salvação.
Pensávamos: "Um dia eles serão 'homens
totais', 'sujeitos da história', enquanto os mendigos vomitavam no meio-fio -
os que a gente chamava com desprezo de "lumpens".
O ponto de partida da incompetência é se sentir
competente. A incompetência atual é competente como nunca. O homem
"bom" do partido não precisa estudar nem Marx nem nada, apenas derramar
sua "missão" para o povo. Administrar é coisa de burguês, de
capitalista. E dá trabalho, é chato pacas examinar estatística, analisar
contratos da PTbrás, tarefas menores, indignas de líderes da utopia.
Para eles, o Estado é o pai de tudo. Logo, o dinheiro
público é deles, a empresa pública é deles, roubar é "desapropriar" a
grana da burguesia.
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Os petistas se sentem "bons". Eles são o
'Bem' e o resto é ou massa de manobra, a massa atrasada, ou "elementos
neoliberais da direita". Ser o Bem te absolve; é irresistível entrar para
um partido assim. É prato feito para os narcisistas da pesada ou psicopatas -
nada melhor do que um partido do "bem" para a arrogância descarada e
legitimação de qualquer roubo e a mentira.
Outra doença infantil (ou senil) é a permanência de
(não riam...) de Hegel nas mentes da "esquerda". O filósofo que
formou Marx continua nos corações petistas. Por esse pensamento, qualquer erro
é justificável por ser uma "contradição negativa", ou seja, qualquer
cagada (perdão...) é o passo inicial para um acerto que virá, um dia.
Como escreveu o filósofo Carlos Roberto Cirne Lima
em Depois de Hegel, de 2006, Hegel tem a tendência muito forte de dizer que
tudo que "é", a rigor, tinha que ser. Hegel diz que para entender a
história é preciso afastar a contingência. Hegel vai provocar o grande erro de
Marx de que a história é inexorável e que, portanto, a revolução comunista é um
momento da história, que necessariamente vai acontecer. Esse é o primeiro
grande erro de Hegel. E Cirne Lima reclama: "Nenhum lógico lê nosso
trabalho porque ele trata de Hegel, e nenhum hegeliano o lê porque é
lógica".
Assim, se organiza a burrice, a estupidez (notem
que falo do "id" petista), a negação de qualquer facticidade, a
adoção só de ideias gerais, dedutivas, o desejo de fazer o mundo caber num
ideário superado ('aufheben'). Daí a desconfiança no mercado, nos
empreendedores, contra todos que trabalham indutivamente, com o mistério das
coisas singulares no centro da sociedade civil que eles veem como uma anomalia
atrapalhando o Estado. Os esquerdistas se sentem parte de uma dinastia desde
Stalin - as palavras e conceitos ainda são usados. E, como no tempo do Grande
Irmão, há o desejo de apagamento do sujeito ou seja, nem a morte tem
importância para sujeitos que viram objetos. Vide Coreia. Até o assassinato
pode ser absolvido como uma necessidade histórica.
Um dia, um companheiro (que morreu há pouco...) me
disse: "Não tema a morte. Marx disse que somos seres sociais. O indivíduo
é uma ilusão. Para o comunista, a morte não existe". E eu sonhei com a
vida eterna.
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Essas são algumas das doenças mentais que estão
levando o Brasil para um pântano institucional. Temos que nos salvar desse
determinismo suicida.
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Se houver a vitória de Dilma ou a volta de Lula
estaremos, como diria Hegel, fo&#dos - numa 'contradição negativa' que vai
durar décadas para ser "superada".
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