terça-feira, 7 de abril de 2009


HISTÓRICO DAS IRMANDADES DE NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO, NO BRASIL, NOS ÚLTIMOS 400 ANOS.

Na foto acima, o "rei" Zé de Durval, a "rainha" Vani de Dagmar e Maria de Clarinha, em 1955, no cortejo de uma das mais lindas festas do Rosário que se tem notícia na cidade de Minas Novas (MG).

A Irmandade de Nossa Senhora do Rosário chegou ao Brasil no século XVI.

Na tradicional e rica cidade de Santos (SP), a igreja matriz tem como padroeira Nossa Senhora do Rosário e desde o século XVII, esta mesma imagem de Nossa Senhora é, também, a padroeira principal de outras cidades importantes como Itu, Parnaíba e Sorocaba.

A partir do fim do período colonial, as irmandades do Rosário passaram a ser constituídas pelos "homens pretos".

No Brasil essas organizações comunitárias religiosas foram adotadas tanto por senhores como pelos escravos, sendo que no caso dos negros, essas irmandades tinham o objetivo de aliviar-lhes os sofrimentos infligidos pelos brancos. Era através das mesas de confrades que os escravos recolhiam as sementes de um capim (misturadas ao barro contendo pó de ouro), cujas contas grossas, denominadas "lágrimas de Nossa Senhora", que serviam para montarem os terços para rezar (seguindo o costume muçulmano mantido pelas tribos a que pertenciam lá na África) na verdade era subterfúgio para o desvio de boa quantidade do ouro apurado nos garimpos. A par disto, organizavam cultos onde, às escondidas, no meio de seus atabaques, tambores e taquaras, iam "contabizando" suas pequenas fortunas de ouro, as quais deixavam sob a guarda de um "provedor" ou "zelador", ex-escravo (forro) escolhido entre os mais confiáveis, a quem chamavam de "Ingoma". Com essa "economia" ou "poupança", erigiam as capelas e também compravam suas cartas de alforria, através de alguns padres mais liberais que conseguiam que seus superiores hierarquicos (os bispos) fizessem "vistas grossas", em relação àquelas manobras. Nas capelas erigidas para o culto à Padroeira, reuniam-se festivamente em datas combinadas, faziam suas mesuras aos bracos, homenageando-os como reis e rainhas, para que pudessem, em paz, ali guardar suas "muambas", suas ferramentas, seus instrumentos musicais e suas melhores vestimentas que eram reservadas para as cerimônias, quando também repartiam, entre si, dinheiro, presentes, comidas, bebidas e gulozeimas. Nestas datas obtiam da Igreja, logicamente em troca de "alfaias" e "joias" que enchiam as burrras dos vigários e cônegos, a autorização para batizados e casamentos.

Dessas organizações, porém, surgiram belíssimos templos, sobrados paroquiais, em função dos quais eram mantidas casas de recolhimento de menores, orfãos, idosos e enfermos, muitos que se tornaram colégios, conventos e hospitais.

Crianças vestidas de anjo, formando o cortejo dos "reis" do Rosário, na Festa de Minas Novas, em 1955.

É de se observar, através da análise das fotos aqui publicadas, que a "Irmandade", apesar da denominação de "Irmandade dos Homens Prestos", nelas as pessoas negras -- durante muito tempo-- ficavam à margem dos festejos, embora nos estatutos rezem cláusulas que determinam que pelo menos um dos "reis" seja descendente de escravos. Estas condições, porém, eram ignoradas pela Mesa Diretora, em razão do preconceito que vigorava na sociedade, quando nem mesmo as crianças negras podiam vestir de "anjos", permanecendo humildezinhas na parte anterior do cortejo. Atualmente estas distorções têm sido evitadas.

Registram-se as seguintes datas de fundação das Irmandades dos Homens Pretos:

1640 - Rio de Janeiro (cidade), Rio de Janeiro

1708 - São João del-Rei, Minas Gerais


1711 - Na cidade de São Paulo a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos está localizada no centro de São Paulo, no Largo do Paissandu. A entidade, foi criada para abrigar a religiosidade do povo negro, impedido de freqüentar as mesmas igrejas dos senhores, resiste à urbanização, mantendo em seu calendário uma devoção secular a Nossa Senhora do Rosário. São realizadas procissões, novenas e rezas do terço, despertando o interesse dos que transitam pelas proximidades da avenida São João e da avenida Rio Branco.


1713Cachoeira do Campo e Sabará, Minas Gerais


1715Ouro Preto, Minas Gerais


1728Serro, Minas Gerais


1754 - Viamão, Rio Grande do Sul


1771 - Caicó, Rio Grande do Norte


1773 - Mostardas, Rio Grande do Norte


1774 - Rio Pardo, Rio Grande do Sul


1796 - Salvador, Bahia


1782Paracatu, Minas Gerais


A Irmandade do Rosário, tradicionalmente possui a seguinte hierarquia: a Mesa Administrativa, o Conselho de Irmãos, a Coorte e o Estado Maior com suas Guardas. Em alguns lugares, devido à perseguição promovida pelo clero, algumas destas irmandades desvincularam-se da Igreja Católica e passaram a agir como terreiros de sincretismo. Mais recentemente, em algumas dioceses há uma reaproximação, através da Pastoral Afro-Brasileira, como é o caso de Belo Horizonte e Contagem onde o Arcebispo Dom Valmor Oliveira tem sido simpático à retomada dessas tradições, à luz de orientações mais liberais e progressistas.

Também o Cardeal Dom Serafim Fernandes de Araujo, que é natural de Minas Novas, tem prestigiado os festejos de Nossa Senhora do Rosário de sua terra natal, lá comparecendo nos últimos anos, onde, piedosamente se mistura ao povo para louvar a padroeira, o que tem sido muito positivo para aumentar o prestígio da Irmandade local..

Com quase três séculos de existência, a Irmandade do Rosário dos Homens Pretos é uma referência para movimentos de consciência negra, porque apresenta uma tradição religiosa que remonta aos tempos dos primeiros escravos.

A Irmandade do Rosário, nas cidades históricas de Minas Gerais, continua sendo a mais antiga, a mais importante e mais prestigiada organização comunitária, prestando relevantes serviços, não só no sentido religioso, mas, principalmente, cumprindo o seu verdadeiro papel social como impulsionadora do Turismo, o que, somente sob este aspecto, beneficia a economia gerando direta e indiretamente emprego e renda para grande parte da população. Tal fenômeno pode ser observado, principalmente em Serro, Diamantina, Datas, Sabará, Paracatu, Contagem, Barbacena, Piranga, Conselheiro Lafaiete, Ouro Branco, São João Del Rei, Mariana, Tiradentes, Conceição do Mato Dentro, Itabira, Nova Era, Raposos, Betim, Bocaiúva, Dores do Indaiá, Oliveira, Caeté e Santa Luzia, cidades em que os festejos religiosos ligados à tradição afro-brasileira, como as folias, os reisados, os congados, os ternos e outras manifestações folclóricas preenchem o rico calendário de eventos, durante todos os meses do ano, atraindo milhares de turistas e fieis que ali comparecem religiosamente, movimentando todos os segmentos econômicos desses importantes municípios

A tradição da Irmandade do Rosário é uma realidade em muitas outras cidades de Minas, sendo que em algumas delas o que se observa, em razão da falta de incentivos e de lideranças locais, é uma forte tendência ao desaparecimento – como associação de confrades – pois lhes resta apenas a motivação religiosa mantida, muito mais pela influência positiva da própria Igreja Católica, que pelo interesse dos "irmãos de opa". Neste caso se enquadram os festejos realizados em Araçuai, Francisco Badaró, Chapada do Norte e Minas Novas.


Nessas cidades, que se localizam bem próximas umas das outras, é muito forte a religiosidade, sendo a imagem de Nossa Senhora do Rosário venerada como padroeira e as datas reservadas à sua festa anual são guardadas como feriados, quando os devotos se dirigem, com muita devoção, às novenas e às cerimônias que se realizam com grande pompa e participação popular. São festejos muito simples, bem peculiares à tradição deixada pelos escravos. Mesmo a parte solene dos festejos considerada como profana, representa o que há de mais original e significativo da fé e do sentimento religioso que a população dessas comunidades conservam em relação à Padroeira dos Negros.


Em cidades próximas a Minas Novas (antiga Vila do Fanado) como Berilo, Itacambira, Turmalina, Capelinha, Senador Modestino e Itamarandiba, que também fazem parte do Vale do Jequitinhonha , a Irmandade já existiu e foi muito importante, nestes locais já não restam sequer as antigas capelas, pois estas, infelizmente, foram demolidas ou relegadas ao abandono e transformadas em ruínas e desfeitas as seculares traddições, diante do descaso das lideranças comunitárias, que assim agiram em nome do "progresso".


O componente antropológico desse fenômeno recomenda estudos mais sérios e aprofundados.

A questão religiosa continua sendo de grande importância, mas a própria Igreja Católica não tem sabido capitalizar a seu favor o potencial que ainda representa esta corrente de fé que prende toda uma população a seu passado, à história da mineração, à saga dos pioneiros, sendo que em muitos casos os padres (a maioria de origem européia ou que desconhece a cultura local) se posicionam de forma contrária à tradição, agindo no sentido de desestimular e até coibir os festejos e as manifestações ligadas ao folclore, o que é lamentável sob todos os aspectos.

geraldo mota
http://geraldomotacoelho.blogspot.com/

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