Mensalão
e a podridão política
O julgamento do mensalão significa que, neste caso,
houve controle jurídico do poder político...
Publicado
por Luiz
Flávio Gomes -
O julgamento do mensalão
significa que, neste caso, houve controle jurídico do poder político, que não
está autorizado a ser malandro, que não pode promover financiamento ilegal para
corromper parlamentares moralmente podres, ainda que seja para assegurar a
governamentalidade, que não pode haver desvio de dinheiro público, sobretudo
para maracutaias partidárias, nem empréstimos fraudulentos, que não se pode
comprar políticos etc. Para o STF, o PT cometeu todas essas irregularidades. O
caso do mensalão do PSDB já está na sua pauta. As acusações são as mesmas. Ou
seja: a podridão moral tomou conta de praticamente todos os partidos políticos
no Brasil.
Dos 40 denunciados, 24
condenados, 13 absolvidos, 2 excluídos do processo e 1 remetido para a primeira
instância. Mais de 250 anos de prisão. Milhões de reais em multa. Todos já
cumprindo suas penas, salvo Pizzolato (que fugiu para a Itália). Ponto positivo
para a estabilidade institucional do país. No Brasil já é possível condenar
gente graúda da política e banqueiros sem golpes de Estado. Reforçou-se o
império da lei repressiva. Pena é que isso aconteça em pouquíssimos casos. A
impunidade, mesmo diante de réus culpados, ainda é a regra. Nas sociedades
civilizadas quando há prova da culpabilidade do réu a condenação deve se tornar
infalível (como pregava Beccaria).
Mas não basta por em ação apenas
o braço da punição. A máquina judiciária muitas vezes realiza seus julgamentos
sem observar o direito vigente (transforma-se assim em máquina do estado de
polícia). Pode até condenar quem merece ser condenado (como no caso do mensalão
do PT), mas não pode deixar de observar o devido processo legal e proporcional
(que faz parte do nosso Estado de Direito). Não houve desmembramento do
processo em relação a quem não tinha foro especial. Isso foi equivocado. A
prova é que o próprio STF já mudou o seu entendimento, em fevereiro de 2014
(INQ. 3515). No caso Paulo Maluf (março de 2014) já fez o desmembramento (AP
863), que passou a ser a regra geral. Só fica no STF quem tem foro por
prerrogativa de função (deputados, senadores etc.). Em eventual reclamação para
a Comissão Interamericana isso vai ser evidentemente levantado.
Também não foi observado o duplo
grau de jurisdição. A Convenção Americana de Direitos Humanos (art. 8º, II, h)
garante o direito a todo réu (no campo criminal) de ser julgado duas vezes.
Esse é o direito vigente (que é muito ignorado no Brasil). Foi descumprido no
mensalão. Caso Barreto Leiva é o precedente da Corte Interamericana de Direitos
Humanos que garante o duplo grau. Toda condenação penal para ser legítima no
Estado de Direito depende de duas coisas: (a) que haja prova indubitável da
culpabilidade do agente – “Beyond a Reasonable Doubt” e (b) e que se observe o
devido processo legal (que conta com regras espalhadas pelas leis, pela constituição e pelos tratados internacionais;
estes, bastante ignorados no nosso país). Fora disso, é a máquina judiciária
cumprindo papel errado (de instrumento do poder de polícia, que deriva do
estado de polícia, que é o oposto do Estado de direito).
Publicado por Luiz
Flávio Gomes
Jurista e professor. Fundador da Rede de Ensino
LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Foi Promotor de Justiça
(1980 a 1983), Juiz..
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