quinta-feira, 1 de maio de 2008

A VELHA ESCOLA "GRUPO ESCOLAR ZÉ BENTO"


 

FICO VELHO E MUXIBENTO

MAS NÃO SAIO DO ZÉ BENTO.

 

 

Quando terminei o curso primário no Grupo Escolar Coronel José Bento Nogueira, que era a única escola da cidade (isto lá pelo ano de 1962), eram poucas as professoras "normalistas" que existia em Minas Novas, isto é, aquelas que haviam terminado o curso Normal para se habilitarem como "mestras".  

 

A maioria das professoras, naquele bom tempo, era de servidoras leigas, ou seja, que havia freqüentado - no máximo - o curso ginasial na vizinha cidade de Araçuaí, ou mesmo, algumas delas como Dona Maria Lopes, segundo ela mesma afirmava, que não tinha terminado nem mesmo o primeiro grau, o que não lhe impedia, porém, de ser respeitada pela sua competência e pela insuperável capacidade de reger uma classe e de fazer com que seus alunos se alfabetizassem e, muito mais do que isto, se tornassem pessoas de bem, bons filhos, bons pais de família e mães exemplares.

 

Era um tempo em que a professora primária se desdobrava como MÃE, dona-de-casa, lavadeira, cozinheira, pedagoga, disciplinária, catequista, regente de classe, auxiliar de saúde, nutricionista e na comunidade era a vigilante que impunha respeito a toda pessoa, adulta ou criança, mesmo que ela não fosse ainda aluno daquela escola e estivesse em qualquer lugar, dentro ou fora dos limites do Grupo Escolar. Um simples olhar de uma professora, dirigida ao aluno, colocava-o atento e em posição adequada que não motivasse qualquer reparo ou oportunidade de repreensão ou admoestação. Na sala de aula levava-se em conta, para efeito de avaliação do desempenho do aluno, não só o seu conhecimento das lições, mas toda a vivência e relacionamento social, tomando-se em todos os detalhes o comportamento na escola, no recinto do lar, na igreja e nas relações comunitárias.Tudo o que se passava com o aluno, na sala de aula, nas ruas e no convívio familiar era motivo de preocupação e avaliação por parte da escola e da professora, sendo esta – na maioria das vezes – que tinha o poder de resolver problemas caseiros e até íntimos, que tendiam fugir do controle doméstico. Ressalte-se que, não bastasse a exigüidade do espaço físico da Escola (10 salas), não havia suficiente pessoal de apoio administrativo, faltavam móveis e equipamentos, era enorme a carência de recursos de toda ordem como material escolar e material pedagógico, ninguém ouvia dizer, se existia ou não, merenda ou uniformes, em cozinha, banheiro ou até mesmo água e luz elétrica, muito menos geladeira, liquidificador, fogão a gás e forno microonda como temos hoje.

 

E os salários? Além do fato de que as professoras quase que não tinham salários compatíveis com o tanto de hora que trabalhavam, só recebiam suas pequenas remunerações depois de passados vários meses, quando já estavam devendo muito além do que recebiam, pois tinham que comprar fiado nos estabelecimentos comerciais, tudo o que necessitavam para comer, para ajudar os alunos mais necessitados e para sustentar suas próprias famílias.

 

Mesmo assim, diante de tanta pobreza e sofrimento, as professoras não deixavam transparecer estas mazelas e faziam da escola um ambiente agradável e respeitoso onde o clima era de contentamento, de alegria, de civismo, de patriotismo e de camaradagem.

 

O Grupo Escolar não era cercado de muros, não havia cercas e a maioria das portas não tinha chaves e, portanto, ficavam abertas dia e noite sem sofrer qualquer dano.  Os quadros, as gravuras, os mapas e os cartazes permaneciam constantemente perfeitos e conservados, sempre afixados nas paredes sem sofrer qualquer sujo, rabisco ou rasgão, podendo ser utilizados por vários anos e em diferentes classes escolares.

 

Qualquer pessoa que chegasse a serviço, em visita ou para tratar de qualquer assunto no recinto da sala de aula era recebido como se fosse uma autoridade, o que determinava a obrigatoriedade de que todos ficassem de pé e em silêncio, em sinal de atenção, de respeito e consideração, assim permanecendo até que fosse dada a permissão para se assentassem novamente e cada um voltasse a cuidar da leitura ou dos trabalhos a que estivesse obrigado naquele momento.

 

As pessoas mais idosas, os policiais, as senhoras de qualquer idade e as autoridades eram todos tratrados com absoluto respeito, mesmo se estivessem fora do ambiente de serviço.

Quando, por motivo rotineiro faltasse uma professora, fosse por apenas um dia ou durante um período maior, não havendo disponível uma substituta, e para que a classe não ficasse sozinha e sem atividade, a diretora ou a secretária assumia o comando dos alunos e convocava, para o dia seguinte, a presença de uma mãe ou de outra pessoa reconhecida como responsável no meio da comunidade, para que ali ficasse de plantão, no cumprimento de tarefas simples, para rezar, fazer pequenas leituras, exercitar ditado de palavras, ensaiarem cantigas, hinos, trovas, poemas, conjugação de verbos ou para acompanhar a turma em pequenos passeios a algum lugar próximo da escola, ao que se chamava de "excursão".

 

Assim era que, as professoras mais requisitadas não podiam adoecer ou tirar licença para maternidade. Aposentar, nem pensavam nessa possibilidade, pois a ausência delas colocava em risco o próprio funcionamento da Escola. E mesmo que houvesse muitas moças que desejavam estudar para se tornarem professoras, não existia oferta de curso de formação – Curso Normal como se chamava – para suprir a demanda crescente de alunos.

 

Os colégios mais próximos que existiam, para onde iam estudar os minas-novenses mais afortunados, localizavam-se em Araçuaí, Diamantina, Teófilo Otoni, Itambacuri. Além destes, somente os de Belo Horizonte, onde o custo de vida era proibitivo para os nossos padrões. Poucas eram as famílias que podiam custear a formação escolar dos filhos, os quais, com toda dificuldade, teriam de morar nessas cidades e, por razões sabidamente naturais, a grande parte das pessoas que saiam para estudar acabavam não voltando para nossa humilde terra, por descobrirem lá fora suas novas vocações ou encontrarem nos centros mais desenvolvidos o ambiente adequado para a nova realidade de suas vidas.

 

Essa injusta situação permaneceu durante muito tempo e seus reflexos negativos podem ser observados ainda hoje, até mesmo no que se refere à estrutura familiar de vez que houve dispersão de valores que poderiam ter sido agregados a favor de nossa comunidade e que se fixaram, por força dessas circunstâncias, em lugares distante onde passaram a frutificar, distantes do velho tronco ressecado e cada vez mais oco que, a duras penas, vem tentando se manter de pé e permitir que brotem novos galhos e novas folhagens.

 

Para corroborar estas minhas assertivas, acerca das ótimas professoras que passaram pela minha infância, passo a escrever, nos próximos dias, sobre os exemplos da ARTE DE ENSINAR, falando de pedagogas como Dona Maria Geralda Silva, Elisa Mota Borges, Elza César Badaró, Lilia Borges, Rosarinha Badaró Ramalho, Adir Sena, Neusa Sena Camargos, Augusta Gomes de Souza, Celina Chagas Coelho, Nilza Gomes, Vany Maciel e, principalmente, das irmãs:  ZARINHA, MYRIAM e ZÉLIA as mais legítimas herdeiras do legado genético (DNA) de verdadeiras mestras, todas essas grandes minasnovenses que deixaram marcas indestrutíveis na minha formação e na memória histórica do GRUPO ESCOLAR CEL.. JOSÉ BENTO NOGUEIRA (ainda bem que tiraram o "coronel" aproveitando-se da oportunidade da mudança de nomenclatura para "Escola Estadual, deixando apenas o "José Bento" que, se bem tivessem pensado, poderia ter sido substituído para um nome mais adequado a um educandário, homenageando com justiça a uma personalidade como "Dona Flora Brasileira Pires César", "Mestra Ritinha Gomes". "Dr. Francisco Martiniano", "Dona Olídia Nepomuceno Leite", "Dona Neide Freire", "Mestre José Gomes".  "Saninha de Zeca", "Dona Maria Lopes", "Serviçal Gabrielzinho" ou "Serviçal Elias Evangelista".  


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geraldo mota
http://geraldomotacoelho.blogspot.com/

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