quarta-feira, 6 de julho de 2011

FREI BETTO: SIGILO ETERNO

FREI BETTO: SIGILO ETERNO

 

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SIGILO ETERNO 
 
Frei Betto  


     Encerrado o  apocalipse, julgados vivos e mortos na grande assembleia universal do Vale de  Jericó, Matusalém e Noé, encarregados do rescaldo final, encontraram nos  escombros de Brasília, espalhados entre ruínas dos ministérios, os arquivos  ultrassecretos da República.

― Veja só, Noé, esses aqui trazem o  carimbo de “sigilo eterno”.

― Eterno!? Essa gente não deu ouvidos ao  que disse Jesus, que tudo aquilo que se passasse às ocultas seria proclamado  nos telhados? Do que as autoridades brasileiras se envergonhavam? – indagou o  ancião da arca.

― Vejamos esses papéis aqui. Tratam da Guerra do  Paraguai. Eis o relatório da atuação do comandante Luís Alves de Lima e Silva,  o Duque de Caxias... Nossa, Noé, que coisa!... Como os soldados brasileiros  foram cruéis com os paraguaios!

― Soldados, Matusalém!? Leia isto aqui:  escravos arregimentados sob a promessa de uma liberdade que nunca veio. A  maioria teve a morte como prêmio de combate.

― Nossa, Noé, e o Barão do  Rio Branco! Como ele ousou ampliar assim, na cara de pau, as fronteiras do  Brasil!?

― É, Matu, por isso há quem, no Itamaraty, prefira que os  documentos fiquem à sombra das barbas do barão. A história se faz entre  heroísmos e baixarias. Só que sempre foi escrita pelos vencedores, jamais  pelas vítimas. Isso de “sigilo eterno” foi para jogar as infâmias pra debaixo  do tapete.

― Veja isso aqui, Noé, os arquivos da ditadura militar.  Repare neste mapa: assinala quando, quem, como e onde foram presas, torturadas  e assassinadas as vítimas cujos corpos jamais foram localizados e pranteados  por suas famílias. E ainda constam os nomes dos militares que participaram de  torturas, assassinatos e seqüestros.

― Matu, e este documento aqui, que  vergonha!


     ― Vergonha por quê?

― São os  “decretos secretos” da ditadura. Como um documento público, o decreto, pode  ser secreto? Isso é o mesmo que alguém se apresentar como ladrão  honesto...

― Ora, Matu, vergonhosos são esses papéis que tratam dos  governos Sarney e Collor.


     ― O que há de  interessante neles?


     ― São dados  estarrecedores! Quanta sujeirada em tantos governos do Brasil! Haja tráfico de  influência, corrupção, nepotismo e favorecimentos. Agora compreendo por que as  autoridades brasileiras sonegaram aos historiadores tantos períodos e fatos da  história do Brasil!

 ― Naquela pasta ali – disse Noé – estão as  licitações secretas da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016 no Brasil. Haja  maracutaia! Obras que ficariam em quinhentos foram multiplicadas por  bilhões!

― Pena que o mundo acabou, a história findou e toda essa gente  virou pó. Como teria sido importante o povo brasileiro ter direito à  transparência histórica! Com certeza teria evitado que a nação repetisse  tantos erros e reelegesse aqueles que distorceram os fatos e os encobriram  para perpetuarem uma boa imagem que jamais  mereceram.


 
Frei Betto é escritor e assessor de movimentos  sociais, autor de “Diário de Fernando – nos cárceres da ditadura militar  brasileira”, entre outros livros. 

 

 


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geraldo mota
http://geraldomotacoelho.blogspot.com/

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