sábado, 14 de fevereiro de 2009

SINAL DIACRÍTICO: TREMA (Mas não é preciso ter medo!)

O trema vai-se tranquilamente...

05/01/2009 17:36

O sinal diacrítico é a primeira vítima do acordo ortográfico

Por Sérgio Rodrigues*

O acordo ortográfico ratificado pelos oitos países de língua portuguesa (Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor Leste) atingirá 230 milhões de pessoas. Segundo o Ministério da Educação e Cultura, "com o acordo, as diferenças ortográficas existentes entre o português do Brasil e o de Portugal serão resolvidas em 98%. A unificação da ortografia acarretará alterações na forma escrita em 1,6% do vocabulário usado em Portugal e de 0,5% no Brasil". Ele entra em vigor em 1º de janeiro de 2009 – até 2012 a antiga norma e a atual coexistirão. Depois...

Fique tranquilo: não são tão frequentes assim as palavras que têm sua grafia alterada pelo novo acordo da língua portuguesa, que estreia oficialmente na virada do ano. Se a ideia o deixa paranoico, temendo uma sequência de erros que acabe em quiproquó, recomenda-se aguentar firme. Um parágrafo como este, com seus oito exemplos de alteração em poucas linhas, seria um acidente raro se não fosse deliberado.

Dos exemplos acima, a maioria tem a ver com a morte do trema. Abolido em Portugal desde 1946, esse sinal diacrítico tem seus simpatizantes, mas representa o menor dos problemas que aguardam os brasileiros nesta fase de transição ortográfica. Isso porque se trata de uma regra cristalina e, sobretudo, sem exceção: cinquenta, linguiça, delinquente, equidade, sequestrador... Basta abolir os dois pontinhos horizontais de tudo (menos, claro, de vocábulos estrangeiros, que estão sujeitos a outras regras) que não há como errar. Vale lembrar que a pronúncia dessas palavras permanece a que sempre foi. A reforma é ortográfica, ou seja, limita-se à forma de escrever.

Os demais exemplos do parágrafo de abertura se referem a outra mudança de impacto, no sentido de afetar um grande número de palavras, mas também de fácil assimilação por sua clareza. Em termos técnicos, estamos falando da queda do acento dos ditongos abertos ei e oi em palavras paroxítonas. Trata-se da regra que cria as grafias heroico, geleia, tipoia, patuleia – como sempre, mantendo-se a pronúncia. Essa mudança só é mais traiçoeira que a do trema por não afetar palavras oxítonas, isto é, cuja sílaba tônica seja a última. Os heróis e seus troféus permanecem acentuados.

A poda de acentos vai mais longe. O circunflexo desaparece de vocábulos como enjoo, voo, veem (do verbo ver) e leem (do verbo ler). Somem também os acentos que diferenciavam, por exemplo, pára (do verbo parar) de para (preposição) e pêlo (substantivo) de pelo (contração prepositiva). Isso cria a possibilidade de construir frases curiosas: "Ele para para comprar pão" ou "A água escorria pelos pelos do animal". Nada que o contexto não esclareça.

O verdadeiro problema, no caso do extermínio dos acentos diferenciais, está nas exceções que comporta. O circunflexo continua vivo para distinguir pode de pôde, pôr (verbo) de por (preposição), tem (singular) de têm (plural). Quanto ao que discrimina fôrma de forma, passa a ser facultativo. E, antes de dizer que isso parece confuso, convém dar uma espiada no capítulo do hífen.

As regras absurdamente tortuosas que regiam o uso do famigerado tracinho, a maioria com suas exceções, eram um dos pilares a sustentar o velho chavão de que "o português é uma língua muito difícil". Nesse caso era mesmo, a tal ponto que até profissionais experientes tinham que recorrer ao dicionário com frequência. A má notícia é que, apesar dos esforços – tímidos – de simplificação, o hífen continua sendo um pesadelo. Sim, o pára-quedas agora passa a ser paraquedas e a auto-escola, autoescola. Em compensação o microondas virou micro-ondas e o antiinflamatório, anti-inflamatório.

É pena, mas o mesmo acordo ortográfico que acabou com a hipocrisia de fingir que não existiam em nossa língua as letras k, w e y capitulou diante do hífen. É melhor conservar sempre à mão um bom dicionário. Pelo menos até a próxima reforma.

*O escritor e jornalista Sérgio Rodrigues, colaborador da Revista da Semana, é autor dos livros What Língua Is Esta e As Sementes de Flowerville.



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geraldo mota
http://geraldomotacoelho.blogspot.com/

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