domingo, 7 de dezembro de 2014

PARA INICIAR AS PUBLICAÇÕES DE MEU LIVRETO "LIRA FANADEIRA"


MINHA TERRA

 

 

Todos cantam sua terra,

Também vou cantar a minha,

Nas débeis cordas da lira

Hei de fazê-la rainha;

 

– Hei de dar-lhe a realeza

Nesse trono de beleza

Em que a mão da natureza

Esmerou-se em quanto tinha.

 

-Correi pr'as bandas do sul:

Debaixo dum céu de anil

Encontrareis o gigante

Santa Cruz, hoje Brasil;

 

– É uma terra de amores

Alcatifada de flores

Onde a brisa fala amores

Nas belas tardes de Abril.

 

- Tem tantas belezas, tantas,

A minha terra natal,

Que nem as sonha um poeta

E nem as canta um mortal!

 

– É uma terra encantada

– Mimosa jardim de fada –

Do mundo todo invejada,

Que o mundo não tem igual.

 

Não, não tem, que Deus fadou-a

Dentre todas – a primeira:

Deu-lhe esses campos bordados,

Deu-lhe os leques da palmeira,

 

E a borboleta que adeja

Sobre as flores que ela beija,

Quando o vento rumoreja

Na folhagem da mangueira.

 

É um país majestoso

Essa terra de Tupã,

Desd'o Amazonas ao Prata,

Do Rio Grande ao Pará!

 

– Tem serranias gigantes

E tem bosques verdejantes

Que repetem incessantes

Os cantos do sabiá.

 

Ao lado da cachoeira,

Que se despenha fremente,

Dos galhos da sapucaia.

Nas horas do sol ardente,

 

Sobre um solo d'açucenas,

Suspensas a rede de penas

Ali nas tardes amenas

Se embala o índio indolente.

 

Foi ali que noutro tempo

À sombra do cajuzeiro

Soltava seus doces carmes

O Petrarca brasileiro;

 

E a bela que o escutava

Um sorriso deslizava

Para o bardo que pulsava

Seu alaúde fagueiro.

 

Quando Dirceu e Marília

Em terníssimos enleios

Se beijavam com ternura

Em celestes devaneios:

 

Da selva o vate inspirado,

O sabiá namorado,

Na laranjeira pousado

Soltava ternos gorjeios.

 

Foi ali, no Ipiranga,

Que com toda a majestade

Rompeu de lábios augustos

O brado da liberdade;

 

Aquela voz soberana

Voou na plaga indiana

Desde o palácio à choupana,

Desde a floresta à cidade!

 

Um povo ergueu-se cantando

– Mancebos e anciãos –

E, filhos da mesma terra,

Alegres deram-se as mãos;

 

Foi belo ver esse povo

Em suas glórias tão novo,

Brandando cheio de fogo:

– Portugal! Somos irmãos!

 

Quando nasci, esse brado

Já não soava na serra

Nem os ecos da montanha

Ao longe diziam – guerra!

 

Mas não sei o que sentia

Quando, a sós, eu repetia

Cheio de nobre ousadia

O nome da minha terra!

 

Se brasileiro nasci

Brasileiro hei de morrer,

Que um filho daquelas matas

Ama o céu que o viu nascer;

 

Chora, sim, porque tem prantos,

E são sentidos e santos

Se chora pelos encantos

Que nunca mais há de ver.

 

Chora, sim, como suspiro

Por esses campos que eu amo,

Pelas mangueiras copadas

E o canto do gaturamo;

 

Pelo rio caudaloso,

Pelo prado tão relvoso,

E pelo tiê formoso

Da goiabeira no ramo!

 

Quis cantar a minha terra,

Mas não pode mais a lira;

Que outro filho das montanhas

O mesmo canto desfira,

Que o proscrito, o desterrado,

De ternos prantos banhado,

De saudades torturado,

Em vez de cantar – suspira!

 

Tem tantas belezas, tantas,

A minha terra natal,

Que nem as sonha um poeta

E nem as canta um mortal!

 

 


 CASIMIRO DE ABREU  (1839-1860)

(Lisboa, 1856)


--
ACESSE o BLOG DE GERALDO MOTA
 

Nenhum comentário:

CONFIRA AQUI OS LIVROS DE MINHA BIBLIOTECA FÍSICA

Cursos Online é Cursos 24 Horas

LIVROS RECOMENDADOS

  • ANÁLISES DE CONJUNTURA: Globalização e o Segundo Governo FHC - (José Eustáquio Diniz Alves /Fábio Faversani)
  • ARTE SACRA - BERÇO DA ARTE BRASILEIRA (EDUARDO ETZEL)
  • AS FORÇAS MORAIS - (José Ingenieros)
  • CONTOS - (Voltaire)
  • DICIONÁRIO DE FANADÊS - Carlos Mota
  • DOM QUIXOTE DE LA MANCHA - (Cervantes)
  • ESPLÊNDIDOS FRUTOS DE UMA BANDEIRA VENTUROSA - (Demósthenes César Jr./ Waldemar Cesar Santos)
  • EU E MARILYN MONROE & O OUTRO- CARLOS MOTA
  • FRAGMETOS - (Glac Coura)
  • HISTÓRIAS DA TERRA MINEIRA - (Prof. Carlos Góes)
  • http://www.strategosaristides.com/2010/12/cronicas-do-mato.html
  • IDAS E VINDAS - (Rosarinha Coelho)
  • MOSÁICO - (Glac Coura)
  • O CAMINHANTE - (José Transfiguração Figueirêdo)
  • O DIA EM QUE O CAPETA DESCEU NA CIDADE DE MINAS NOVAS - (João Grilo do Meio do Fanado)
  • O MITO DO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO - (Celso Furtado)
  • O NOME DA ROSA - (Umberto Eco)
  • O PRÍNCIPE - (Maquiavel)
  • O SEGREDO É SER FELIZ - ROBERTO SHINYASHIKI

ORIGEM DOS ACESSOS PELO MUNDO

Arquivo do blog