segunda-feira, 28 de abril de 2008

PORQUE SOMOS UM MUNICÍPIO TÃO POBRE?

A EDUCAÇÃO E A CULTURA NO MUNICÍPIO DE MINAS NOVAS

 

Minas Novas é um dos mais antigos municípios do Estado de Minas Gerais e da sua antiga extensão geográfica hoje existe cerca de 150 cidades, entre elas Teófilo Otoni, Araçuaí, Almenara, Capelinha, Itamarandiba, Turmalina, Berilo, Chapada do Norte e muitas outras, próximas ou longínquas, conforme quadro demonstrativo que será apresentado mais adiante.

 

Até bem pouco tempo – e durante mais de 200 anos – este município foi um verdadeiro "curral" dominado pelo interesse de uma família que o explorava literalmente como sua exclusiva propriedade, sobrevivendo o povo a duras penas, enquanto todas as outras cidades se desenvolviam e a nossa terra cada vez mais ficava para trás, no subdesenvolvimento e na miséria de sua população.

 

E o termo "exploração" não seria adequado se levássemos em consideração que, para se explorar alguma coisa, com o mínimo de razoabilidade, antes se tornaria necessário o emprego de algum esforço, de algum interesse, da adoção de algum cuidado ou critério, por parte do explorador, além do ato de só espoliar, tendo-se em conta o melhor aproveitamento da atividade explorada, o que veremos jamais foi a preocupação da referida família feudal que ali dominou por mais de um século.

 

Em toda a história dos povos civilizados podemos notar que as comunidades mais preocupadas com a educação, com a boa formação das crianças e dos jovens, foram justamente as que mais se desenvolveram e se tornaram cidades e municípios pujantes, inclusive muitas das comunidades vizinhas a Minas Novas, como Diamantina, Araçuaí, Teófilo Otoni, Itambacuri, Capelinha, etc.

 

Mesmo os tiranos, os grandes fazendeiros, os chefões políticos e os coronéis – de que se tem notícias em outros municípios -- todos tinham o cuidado de administrar seus feudos de tal forma que a população tivesse algum retorno e, assim, mesmo que sob o estalar da chibata, pudessem sentir um pouco valorizados para produzir cada vez mais e sempre, multiplicando as riquezas da Casa Grande.  Esses exploradores, geralmente tinham o cuidado de investir parte de seus lucros na construção de castelos, fortalezas, canais, engenhos, templos, praças, quartéis, cadeias, alojamentos e raros, muito poucos, se preocupavam com hospitais, escolas, bibliotecas e outras instalações que consideravam nocivas ao interesse do mandatário. Para estas futilidades, bastava ter o dinheiro suficiente para mandar os filhos e os afilhados estudarem na Corte, nas capitais e nos grandes centros. O chefão, porém, não se afastava de seu feudo e por ali circulava empunhando seu trabuco, seu chicote e distribuindo as migalhas que lhe garantiam consideráveis retornos em colheitas abundantes, eterna e submissa gratidão, safras de afilhados, apaniguados e eleitores sempre fieis.

 

Somente os filhos do coronel se transformavam em doutores e, pelo menos um deles, deixando na capital a sua família legítima, voltava às origens para dar continuidade ao império. Os demais herdeiros, porém, sempre vinham uma ou duas vezes ao ano, para conferir suas posses, fazer festas e agrados, conquistar a simpatia e o amor platônico dos campônios e imediatamente voltavam para seus mundos do luxo, da ociosidade e da fartura à custa do suor e do sofrimento de toda uma população raquítica, analfabeta e escravizada pela ignorância e pela falta de horizontes. Essa realidade existiu até bem pouco tempo, se é que ainda não existe na cabeça de muitos de nossos conterrâneos saudosos do cocho das Cavalhadas.

 

No caso específico de Minas Novas é interessante de se observar que a exploração se deu de tal forma predatória que, na medida em que se exauriam os recursos naturais de toda a região, sem manejo adequado e sem qualquer preocupação dos prefeitos em procurar investimentos, e tocar o município sem qualquer critério, ou pela ação dos exploradores sem a necessária reaplicação de parte dos lucros para incentivar a produção e a colheita, o que se apurou foi a completa falência do município e na visível depuração da miséria do povo, sendo que até mesmo a estrutura feudal, que existia até os anos 1940, foi-se definhando, ao ponto de quase nada ter sobrado – de pé – daquelas propriedades que estiveram sob o domínio de tal família. Digo apenas domínio, pois não se tem notícia de um único tijolo, uma pedra de alicerce ou um esteio de curral que tenha sido fincado com recursos particulares ou com os esforços de tal gente, podendo-se afirmar que todos os bens imóveis, móveis, semoventes e benfeitorias que compunham o velho curral foram agregados, com o passar do tempo, como resultado de sucessivas rapinagens e pela sanha insaciável da tirania.

 

Em todas as cidades mais antigas, no seu conjunto arquitetônico urbano, existe sempre algum imóvel importante que sirva de ponto de referência da nobreza da família feudal, do coronel ou do antigo chefe político, seja um solar, um sobrado, uma casa, a sede de uma fazenda, uma capela ou até mesmo um herdeiro natural, um neto, um bisneto ou outro parente qualquer – mesmo que bastardo – que possa apresentar-se orgulhoso do nome, da tradição ou da memória de seus ancestrais.

 

No meu tempo de menino, pelos meados dos anos 50, lembro-me muito bem dos últimos gritos de João de Beata, que da rua se escutava lá na Curva do Mirante, tangendo as juntas de boi atreladas ao antigo engenho de cana, no sopé do Córrego da Chácara, ao lado da belíssima sede da Fazenda dos Portugueses, que fora ocupada pela família do coronel, tão logo foram escorraçados os religiosos, chefiados pelo Cônego Pacífico Peregrino e Silva, que ali residiam no Cabido de São Pedro do Fanado.

 

Assisti, subindo o Morro da Contagem, o último caminhão carregado com o velho sino, as talhas residuais do altar e as madeiras do casarão que foram adquiridas por Olavo e Salomão.

 

A casa do Largo das Cavalhadas, onde hoje funciona a Rádio Bonsucesso, tinha lustres ingleses, relógio de carrilhão, biblioteca, móveis e vasilhame de Casa Senhorial, tendo sido a residência oficial do Tenente-Coronel Domingos de Abreu Vieira, rico comerciante e fazendeiro – proprietário da Casa Laporte (de armas e munições), compadre de Tiradentes e que se tornou inconfidente, o que lhe custou a prisão e o despojo de seus bens, que foram confiscados pela Coroa Portuguesa, juntamente com muitos outros em todo o município. A referida mansão, lacrada durante muitos anos, foi reaberta para ser Pousada. No terreiro daquele imóvel, onde se construiu a agência da Minascaixa, era a "Laporte" e, em frente, a "Botica", onde fez fortuna o velho Osório.

Do outro lado, na direção da Cadeia, era a Casa do Império. Imóvel onde residiu o advogado Dr. Arlindo Vieira, depois foi vendida para o comerciante  Raul Marcolino, imóvel que foi demolido para dar lugar à residência do gerente do Banco do Brasil. Ali era a famosa sede do Império do Divino, chamado de "Paráclito", que um juiz de direito corrupto (ateu e excomungado pelo Papa Leão XIII), por vingança, já no início do século 20 mandou que o intimasse como pessoa física comum, para responder por processo de falência, não encontrado pelo oficial de justiça, considerado revel foi acusado de estar inadimplente com o erário municipal e também pelo fato de "estar mantendo um império" em plena vigência de uma República, teve os bens arrecadados para, em hasta pública, liquidar os débitos fiscais e arcar com as despesas processuais e honorários advocatícios.

 

Tais bens, assim como a Casa de Caridade e algumas casas que existiam no Largo de São Gonçalo, ficaram com a Igreja (incorporadas depois à Conferência de São Vicente), mas os demais foram arrematados pelo valor mínimo, quase nada, pelo próprio velhaco juiz que se apoderou de todos os mais valiosos que, por justa razão, deveriam estar hoje sob o controle da Irmandade do Santíssimo Sacramento dos Homens Brancos de Minas Novas.

 

A Escola Normal, que foi criada pelo Dr. Francisco Martiniano, e que funcionava no sobradão, teve cancelada sua licença de funcionamento, também no início do século passado, por ordem do Coronel José Bento Nogueira, pois este chefe político de Minas Novas entendeu que o referido estabelecimento de ensino - único em toda a região -- era nocivo aos interesses do povo, de vez que abria suas portas a quantos se interessassem pela educação, inclusive permitindo a matrícula das negras, dos filhos de ex-escravos, das lavadeiras de roupa, das cozinheiras e das buscadeiras de lenha, estes pobres coitados que, ao se formarem como normalistas, estariam colocando em risco o bom funcionamento das casas de família, por falta de trabalhadores dos afazeres domésticos.

 

Um outro ponto a ser considerado – no contexto da formação cultural de várias gerações do município de Minas Novas – é o fato de que até o início da década de 1960 só existia um estabelecimento de ensino na cidade – O Grupo Escolar CORONEL José Bento Nogueira – havendo na zona rural uma ou outra professora leiga (quase que analfabeta) que recebia da prefeitura apenas para ensinar aos alunos assinar o próprio nome e "fazer eleitores".

 

Em 1961 foi fundado o Ginásio Minas Novas, pelo médico Dr. Agostinho da Silva Silveira, um forasteiro que foi considerado, em decorrência dessa iniciativa, como extravagante e lunático, sendo que os professores que aderiram ao projeto -- na condição de voluntários -- quase nada recebiam pelo trabalho de lecionar, sendo muitos deles obrigados – por força do pioneirismo e da cidadania – a se desdobrarem no ensino de diferentes matérias, sem qualquer recurso oficial, indiferentes à postura contrária de muitos que demoraram aceitar a nova realidade. Para o funcionamento desse Educandário foram convocadas pessoas da corrente política contrária à administração do município, depois de convencidas, nesse sentido, pelo juiz de direito Dr. Guaracy Vasconcelos e sua esposa Dona Myriam Bessa, que eram novatos na cidade e ficaram perplexos com a falta de organização comunitária diante da resistência inicial de lideranças ligadas ao "coronel", por não terem dele recebido a necessária liberação para colaborar.

 

A Escola Estadual Dr. Agostinho da Silva Silveira, a única com curso colegial (segundo grau) foi instalada no final da década de 1970, em razão de esforços de um grupo de minasnovenses que faziam oposição à administração municipal, sob protesto dos políticos locais que insistiam em conservar a deficitária e inviável Escola da Comunidade Badaró Júnior, simplesmente em razão do nome e que, se assim fosse mantida, não poderia passar a ser custeada pelo Estado.

 

Quanto ao Ensino Superior, cuja oferta continua precária, se dependesse apenas da vontade de um grande minasnovense – o Cardeal Dom Serafim Fernandes de Araújo – o nosso município já estaria contemplado com diversos cursos de graduação, com as vantagens da oferta de excelente ensino e de ótimas condições favoráveis a todas as classes econômicas. Entretanto, contrariamente aos interesses coletivos, deixando de se considerar as propostas da Reitoria da PUC e o determinado interesse de aqui se instalar um "campus avançado" da PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA,  cujo projeto já estava bem adiantado – por razões simplesmente corporativas deu-se a preferência à UNIPAC, cujo funcionamento é oneroso aos cofres do município a aos bolsos tão sacrificados de nossas pobres famílias.

 

QUOUSQUE TANDEM... ?

--
geraldo mota
http://geraldomotacoelho.blogspot.com/

Nenhum comentário:

CONFIRA AQUI OS LIVROS DE MINHA BIBLIOTECA FÍSICA

Cursos Online é Cursos 24 Horas

LIVROS RECOMENDADOS

  • ANÁLISES DE CONJUNTURA: Globalização e o Segundo Governo FHC - (José Eustáquio Diniz Alves /Fábio Faversani)
  • ARTE SACRA - BERÇO DA ARTE BRASILEIRA (EDUARDO ETZEL)
  • AS FORÇAS MORAIS - (José Ingenieros)
  • CONTOS - (Voltaire)
  • DICIONÁRIO DE FANADÊS - Carlos Mota
  • DOM QUIXOTE DE LA MANCHA - (Cervantes)
  • ESPLÊNDIDOS FRUTOS DE UMA BANDEIRA VENTUROSA - (Demósthenes César Jr./ Waldemar Cesar Santos)
  • EU E MARILYN MONROE & O OUTRO- CARLOS MOTA
  • FRAGMETOS - (Glac Coura)
  • HISTÓRIAS DA TERRA MINEIRA - (Prof. Carlos Góes)
  • http://www.strategosaristides.com/2010/12/cronicas-do-mato.html
  • IDAS E VINDAS - (Rosarinha Coelho)
  • MOSÁICO - (Glac Coura)
  • O CAMINHANTE - (José Transfiguração Figueirêdo)
  • O DIA EM QUE O CAPETA DESCEU NA CIDADE DE MINAS NOVAS - (João Grilo do Meio do Fanado)
  • O MITO DO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO - (Celso Furtado)
  • O NOME DA ROSA - (Umberto Eco)
  • O PRÍNCIPE - (Maquiavel)
  • O SEGREDO É SER FELIZ - ROBERTO SHINYASHIKI

ORIGEM DOS ACESSOS PELO MUNDO

Arquivo do blog