CARTAS CHILENAS
PRÓLOGO
Amigo leitor, arribou a certo porto do Brasil, onde eu vivia, um galeão, que vinha das Américas espanholas. Nele se transportava um mancebo, cavalheiro instruído nas humanas letras. Não me foi dificultoso travar com ele uma estreita amizade, e chegou a confiar-me os manuscritos, que trazia. Entre eles encontrei as Cartas chilenas, que são um artificioso compêndio das desordens, que fez no seu governo Fanfarrão Minésio, general de Chile.
Logo que li estas Cartas, assentei comigo que as devia traduzir na nossa língua, não só porque as julguei merecedoras deste obséquio, pela simplicidade do seu estilo, como, também, pelo benefício que resulta ao público, de se verem satirizadas as insolências deste chefe, para emenda dos mais, que seguem tão vergonhosas pisadas.
Um D. Quixote pode desterrar do mundo as loucuras dos cavaleiros andantes; um Fanfarrão Minésio pode também corrigir a desordem de um governador despótico.
Eu mudei algumas coisas menos interessantes, para as acomodar melhor ao nosso gosto.
Peço-te que me desculpes algumas faltas, pois, se és douto, hás de conhecer a suma dificuldade que há na tradução em verso.
Lê, diverte-te e não queiras fazer juízos temerários sobre a pessoa de Fanfarrão.
Há muitos fanfarrões no mundo, e talvez que tu sejas também um deles, etc.
... Quid rides? mutato nomine, de te
Fabula narratur...
69 e 70.
DEDICATÓRIA AOS GRANDES DE PORTUGAL
Ilmos. e Exmos. senhores,
Apenas concebi a idéia de traduzir na nossa língua e de dar ao prelo as Cartas Chilenas, logo assentei comigo que Vv. Exas. haviam de ser os Mecenas a quem as dedicasse. São Vv. Exas. aqueles de quem os nossos soberanos costumam fiar os governos das nossas conquistas: são por isso aqueles a quem se devem consagrar todos os escritos, que os podem conduzir ao fim de um acertado governo.
Dois são os meios por que nos instruímos: um, quando vemos ações gloriosas, que nos despertam o desejo da imitação; outro, quando vemos ações indignas, que nos excitam o seu aborrecimento. Ambos estes meios são eficazes: esta a razão por que os teatros, instituídos para a instrução dos cidadãos, umas vezes nos representam a um herói cheio de virtudes, e outras vezes nos representam a um monstro, coberto de horrorosos vícios.
Entendo que Vv. Exas. se desejarão instruir por um e outro modo. Para se instruírem pelo primeiro, têm Vv. Exas. os louváveis exemplos de seus ilustres progenitores. Para se instruírem pelo segundo, era necessário que eu fosse descobrir o Fanfarrão Minésio, em um reino estranho! Feliz reino e felices grandes que não têm em si um modelo destes!
Peço a Vv. Exas. que recebam e protejam estas cartas. Quando não mereçam a sua proteção pela eloqüência com que estão escritas, sempre a merecem pela sã doutrina que respiram e pelo louvável fim com que talvez as escreveu o seu autor Critilo.
Beija as mãos
De Vv. Exas.
O seu menor criado...
Pedro Mexia, in "Primeira Pessoa"
Muitos são os tipos de correspondências que este humilde escriba sabe que existe, dentre elas a velha e tão útil carta, uma modalidade que é também conhecida como missiva ou epístola e que pode ser enviada sob várias denominações, a saber:
Nenhum comentário:
Postar um comentário