Gregório de Matos Guerra: o Boca do Inferno
Gregório
de Matos Guerra nasceu em Salvador (BA) e morreu em Recife (PE). Estudou no
colégio dos jesuítas e formou-se em Direito em Coimbra (Portugal). Recebeu o
apelido de Boca do Inferno, graças a sua irreverente obra satírica.
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Gregório
de Matos firmou-se como o primeiro poeta brasileiro: cultivou a poesia lírica,
satírica, erótica e religiosa. O que se conhece de sua obra é fruto de inúmeras
pesquisas, pois Gregório não publicou seus poemas em vida. Por essa razão, há
dúvidas quanto à autenticidade de muitos textos que lhe são atribuídos.
O poeta
religioso
A
preocupação religiosa do escritor revela-se no grande número de textos que
tratam do tema da salvação espiritual do homem. No soneto a seguir, o poeta
ajoelha-se diante de Deus, com um forte sentimento de culpa por haver pecado, e
promete redimir-se. Observe:
Soneto a
Nosso Senhor
Pequei,
Senhor, mas não porque hei pecado,
Da vossa alta clemência me despido;
Porque quanto mais tenho delinquido
Vos tem a perdoar mais empenhado.
Da vossa alta clemência me despido;
Porque quanto mais tenho delinquido
Vos tem a perdoar mais empenhado.
Se basta
a voz irar tanto pecado,
A abrandar-vos sobeja um só gemido:
Que a mesma culpa que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado.
A abrandar-vos sobeja um só gemido:
Que a mesma culpa que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado.
Se uma
ovelha perdida e já cobrada
Glória tal e prazer tão repentino
Vos deu, como afirmais na sacra história.
Glória tal e prazer tão repentino
Vos deu, como afirmais na sacra história.
Eu sou,
Senhor a ovelha desgarrada,
Recobrai-a; e não queirais, pastor divino,
Perder na vossa ovelha a vossa glória.
Recobrai-a; e não queirais, pastor divino,
Perder na vossa ovelha a vossa glória.
O poeta
satírico
Gregório
de Matos é amplamente conhecido por suas críticas à situação econômica da
Bahia, especialmente de Salvador, graças à expansão econômica chegando a fazer,
inclusive, uma crítica ao então governador da Bahia Antonio Luis da Camara
Coutinho. Além disso, suas críticas à Igreja e a religiosidade presente naquele
momento. Essa atitude de subversão por meio das palavras rendeu-lhe o apelido
de "Boca do Inferno", por satirizar seus desafetos
Triste
Bahia
Triste
Bahia!
ó quão dessemelhante
Estás e estou do nosso antigo estado!
Pobre te vejo a ti, tu a mi abundante.
ó quão dessemelhante
Estás e estou do nosso antigo estado!
Pobre te vejo a ti, tu a mi abundante.
A ti
tricou-te a máquina mercante,
Que em tua larga barra tem entrado,
A mim foi-me trocando e, tem trocado,
Tanto negócio e tanto negociante.
Que em tua larga barra tem entrado,
A mim foi-me trocando e, tem trocado,
Tanto negócio e tanto negociante.
O poeta
lírico
Em sua
produção lírica, Gregório de Matos se mostra um poeta angustiado em face à
vida, à religião e ao amor. Na poesia lírico-amorosa, o poeta revela sua amada,
uma mulher bela que é constantemente comparada aos elementos da natureza. Além
disso, ao mesmo tempo que o amor desperta os desejos corporais, o poeta é
assaltado pela culpa e pela angústia do pecado.
Alcunha
A alcunha boca do inferno foi dada a Gregório por sua
ousadia em criticar a Igreja Católica,
muitas vezes atacando padres e freiras. Criticava também a "cidade da
Bahia", ou seja, Salvador, como
neste soneto:5
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Tristes sucessos, casos
lastimosos,
Desgraças nunca vistas, nem
faladas.
São, ó Bahia, vésperas choradas
De outros que estão por vir
estranhos
Sentimo-nos confusos e teimosos
Pois não damos remédios as já
passadas,
Nem prevemos tampouco as
esperadas
Como que estamos delas desejosos.
Levou-me o dinheiro, a má
fortuna,
Ficamos sem tostão, real nem
branca,
macutas, correão, nevelão,
molhos:
Ninguém vê, ninguém fala, nem impugna,
E é que quem o dinheiro nos
arranca,
Nos arrancam as mãos, a língua,
os olhos.
-
Por tal
motivo, entre outros citados na sua biografia, como sua poesia pornográfica, os
quais fizeram de Gregório um poeta considerado "rebelde" que, apesar
de ser um clássico, hoje ainda muitos consideram também um poeta maldito, ele se torna o primeiro poeta do
Brasil que poderíamos, de certo modo, definir desta forma. 8
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Mas, como bem o afirmou a PROFESSORA IRENE CARAÍBA,
o mesmo poeta poderia ter a mesma inspiração se vivesse hoje e viesse morar no
município de MINAS NOVAS:
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Que falta
nesta cidade?... Verdade.
Que mais
por sua desonra?... Honra.
Falta mais
que se lhe ponha?... Vergonha.
O demo a
viver se exponha,
Por mais
que a fama a exalta,
Numa
cidade onde falta
Verdade,
honra, vergonha.
Quem a pôs
neste rocrócio?... Negócio.
Quem causa
tal perdição?... Ambição.
E no meio
desta loucura?... Usura.
Notável
desaventura
De um povo
néscio e sandeu,
Que não
sabe que perdeu
Negócio,
ambição, usura.
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