sexta-feira, 17 de julho de 2015

TIAGO PRIMO DE OLIVEIRA - CAPITÃO DO TAMBOR EM MINAS NOVAS




TIAGO, CAPITÃO DO TAMBOR E PRESIDENTE-REI DA JUSTIÇA DIVINA


Era Tiago um homem simples do povo, um lavrador analfabeto que certo dia, para se defender no ambiente hostil da zona rural em que morava, lá no sítio do “Mato Virgem” próximo ao Arraial do Sucuriú, naquele momento de infelicidade para ambos,  foi ele obrigado a atentar contra a vida de seu agressor, pelo que foi condenado a  ficar muitos anos preso na cadeia de Minas Novas.

Devido a sua simplicidade,  seu comportamento humilde, amistoso e cordato com todos do local,  granjeou afeição de todos da cidade, assim como a confiança das autoridades judiciárias e, assim,  podia prestar serviços a terceiros, de tal forma que, depois de ter sido julgado em júri popular e ter cumprido sua pena, foi ficando ali na cidade, depois trouxe o resto de sua família e, com o tempo, integrou-se totalmente ao dia-a-dia do lugar, sempre  muito prestativo e muito querido na comunidade fanadeira.

Apesar do tempo, de já haver cumprido totalmente a pena que lhe fora imposta e diante da nova realidade em que vivia, mesmo assim carregava consigo o remorso pelo ato praticado, e considerando as circunstâncias do fato que não lhe fugia da memória, tudo aquilo foi-lhe pesando na consciência de homem rude e frágil, a um só tempo analfabeto e cheio de imaginações que não conseguia entender,  o que lhe comprometeu as faculdades mentais, passando ele a ter visões e a ouvir estranhas vozes do além, resultando no comportamento bizarro de perambular pelas ruas da cidade, como um beato, praticando jejuns, rezando e pregando uma nova ordem e um novo e único calendário para organizar o mundo.

Contudo, era ele um trabalhador honesto, manso, pacato, inofensivo. Sua presença, em qualquer lugar, a ninguém incomodava,  muito pelo contrário, era agradável e sempre muito bem recebido, participando ativamente das festas religiosas, nas procissões e cerimônias, mesmo as cívicas, onde comparecia a caráter, como se fosse uma autoridade, ostentando uma capa vermelha e uma coroa de latão, declarando-se o Presidente-Rei da Justiça Divina, coletando assinaturas no seu “livro sagrado” e divulgando o “calendário” de 10 meses, cada um com 36 dias e meio, bem como sua nova moeda, chamada de “natal” cujo valor correspondia a dez centavos do real, dos qual a ninguém era permitido ter mais que 10.000,00 natais e, sempre que esse valor fosse atingido, deveria o que exceder ser remetido, pelo portador, ao governo para que o valor fosse distribuído em obras a favor do povo pobre.

Por onde ia, levava consigo uma curiosa pedra de cristal de rocha, bem clara e translúcida, dentro da qual via-se algumas formações de quartzos, as quais ele entendia como se fossem letras e sinais divinos que o indicavam as profecias que ia divulgando, além de um caderno grande, que era o seu “livro sagrado”.

No referido livro, além das assinaturas que ia colhendo, havia o registro de pessoas importantes, tanto da cidade como de visitantes, que lhe elogiavam o comportamento e faziam referências positivas sobre a sua piedosa, mas visionaria  pregação, algumas muito interessantes e sábias, todas anônimas, como por exemplo:

“Somos todos como pequeninos espelhos, nos quais Deus se contempla: como podemos querer que Deus Se reconheça em uma alma impura? “

“Crer significa Ter Achado! “

 “O homem demanda a Deus, quando tem o coração puro”

 Além dessas "escrituras" , chancelas e carimbos, havia no caderno outras anotações como a que se segue:



“ MANDADO:
           
 A quem possa interessar, declaro que a partir de minha posse, este próximo dia primeiro de janeiro ficará sendo segunda-feira, mas o primeiro dia deste mês e deste que será o meu primeiro ano-novo.

            Todos os meses serão iguais e terão 36 dias e meio, sendo todos os dias santos, nos quais, porém, será permitido o trabalho em todos eles, até mesmo no dia de domingo, sendo que o descanso será obrigatório apenas no meio-dia que sobra, quando cada um deverá permanecer completamente parado, isolado em sua casa, em silencio e pensando em nada, para que somente o relógio trabalhe, atento e cuidadoso,  completando e aperfeiçoando  o arredondamento das suas horas e ajustando a vida de acordo com a determinação  do Grande Arquiteto e segundo os rumos dos seus ponteiros.

            O relógio da vida, que fica nas mãos do Arquiteto, marca o passado, o presente e o futuro,  e sobre esses tempos, viaja constantemente o seu Santo Paráclito, que em cada lugar recebe um nome, de acordo com os costumes e as línguas que falam os diferentes povos, podendo ser reconhecidos na pessoa de Jesus Cristo, de Javé, de Alá, de Maomé, de Moisés, de Elias, de Abraão, de Buda, de Gualtama, de Isis, de Brama,  de Baal, de Isis de Odim, de Ogum, de Tupã, de Guaraci,  de Jacy ou de um simples sinal indicado em qualquer ponto do painel do universo cósmico, onde se acredita ser ali a janela por onde nos segue a poderosa visão de Deus .

            O sol e a lua, auxiliados pelas estrelas, pelos ventos, pelas chuvas e pela boa vontade da natureza, são os encarregados de vigiar o tempo comum, este em que respiramos, e os diversos guias, que somos todos nós, na nossa obrigação de conduzi-lo pelo mundo, sempre lembrando-nos de que o tempo da sabedoria é o mais importante presente de Deus e este é que deve ser utilizado, pois nele residem os bons pensamentos, as boas obras e os  melhores caminhos para as realizações a favor de todos os viventes, sejam eles gente, bichos ou plantas e as demais coisas que não  vivem mas que existem mesmo assim, sem vida, na terra e no mundo de Nosso Senhor, nosso Deus.

            Ficam, desde já, terminantemente proibidas a falta de religião, a cobiça, a tristeza,  a maldade, a miséria e a injustiça.
           
            Mando que se extraiam copias deste mandado para que sejam remetidas aos presidentes e reis de todos os países, ao Papa, aos cientistas, aos professores, aos fabricantes de folhinhas, os publicadores de jornais e aos donos de rádios e da televisão, que terão a minha augusta permissão de fazê-lo conhecido e obedecido, sob as penas e o rigor da minha Lei.    
     
            Revogam-se todas as leis, todos os códigos, todas as bíblias, todas as bulas, todas as receitas, todos os catálogos e todas as constituições.

            CUMPRA-SE.  PUBLIQUE-SE.

Tiago Primo de Oliveira –
PRESIDENTE-REI DA JUSTICA DIVINA DE TODOS OS PAISES (232)

Maria José Coelho da Silva -
SECRETARIA E MINISTRA GERAL (233)”


Quando tive a oportunidade de ver o referido caderno, nele assim consignei:


    TIAGO,

Ministro da Justiça Divina,
Feliz já foste tu empossado.
Decreta, calcula e examina
E reorganiza o nosso Estado.

Proclama sempre a nova era
Contida nesse teu calendário
Pois a vida, ao tempo espera
Para melhorar o teu fadário.

Saiba que és filho da vontade
Do Mensageiro da Paz e da Luz,
Desejo que é dessa terra inteira.

Maria é tua Mãe, de verdade,
São João é o primo de Jesus,
És Tiago, Primo de Oliveira.
(Lalau Mota,
No Bar de Raul Marcolino, 
Minas Novas, 23.12.1998)


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